A expansão do metrô do Rio e de São Paulo para bairros mais caros como Leblon e Higienópolis, respectivamente, gerou declarações de moradores como a de que “gente diferenciada” teria acesso aos bairros (veja a declaração de uma moradora de Higienópolis). A citação mais revela do que choca, pois constata o óbvio: a divisão de classes precisa também ser feita fisicamente. O acesso e o livre direito de ir e vir que a mobilidade urbana proporciona não chega a ser argumento plausível para o discurso daqueles que enxergam nos “desiguais” o outro, pois só são capazes de falar em igualdade de direitos quando se trata de “gente como a gente”. Os “diferenciados” devem, portanto, permanecer afastados dos bairros “residenciais”.
Como morador do Rio há quase dois anos, não foram poucas as vezes que ouvi os próprios cariocas dizerem que “arrastões” não existiam na Zona Sul antes das estações chegarem a Copacabana e Ipanema. Aliás, é comum dizer que, depois do metrô (linha 4), o Leblon se tornará uma Copacabana, como se isso fosse algo depreciativo.
É fato que o metrô dá acesso. Num domingo de sol, é comum ver o fluxo intenso das pessoas rumo as praias da Zona Sul. Pessoas que saem da Baixada Fluminense, Niterói, Zona Norte e Jacarepaguá acordam cedo para aproveitar o dia nas areias mais famosas do Brasil. O metrô se torna, assim, uma extensão da praia. São cadeiras, isopores, ambulantes, areia e gente com poucas roupas nos vagões dos charmosos Mafersas (modelo das composições da Linha 1).
O transporte permite, portanto, que as pessoas usufruam dos espaços públicos, mesmo não sendo um morador do bairro. Já que, com o metro quadrado mais caro do país, bairros como Leblon e Ipanema se limitam a uma elite de herdeiros, investidores estrangeiros e funcionários públicos. Com a média salarial paga no Rio de Janeiro (bem abaixo da de São Paulo), o trabalhador consegue, no máximo, morar longe das praias que ainda são apropriadas para o banho. Sem o acesso facilitado, boa parte da população não aproveitaria as areias da Princesinha do Mar, passando os fins de semana longe do Arpoador e sem poder aplaudir o pôr do Sol, mesmo sendo carioca e morando no Rio de Janeiro.
Talvez a praia do Leblon modifique o seu público com a chegada do metrô da Linha 4, prevista para ser inaugurada no meio do ano que vem. Mas não seria a praia o espaço em que as hierarquias e as divisões de classe deveriam deixar de existir? O acesso não será apenas físico. Será também humano. Quem se permitir e entender que uma cidade precisa dialogar entre si, enxergará o metrô não como uma ameaça ao status quo, mas uma oportunidade de inclusão e democratização dos espaços públicos. Próxima Estação: tolerância!