“Em São Paulo, mais linhas de ônibus só vão engarrafar a cidade”, foi esta a declaração que o pré-candidato José Serra em um debate com a deputada federal Manuela D’Ávila (PC do B), discussão esta que teve como foco o livro “O Triunfo das Cidades”, do economista Edward Glaeser, e aconteceu no Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper).
As declarações não foram bem vistas a Urbanistas, e segundo o portal “Planeta Sustentável” o pensamento do ex-prefeito é um equivoco. O site trouxe dados bem interessantes sobre o pensamento contrário de Serra:
“São Paulo possui 17 mil quilômetros de vias (ruas e avenidas). A frota de automóveis registrados na cidade está em torno dos 7 milhões e estima-se que cada carro transporte, em média, 1,2 pessoas (66% circulam apenas com o motorista). Por conta disso, segundo o engenheiro de tráfego Horácio Figueira, 90% das vias são ocupadas por carros.
Mas se analisarmos a divisão modal da cidade, vemos que das 38 mil viagens diárias feitas em São Paulo, perto de 14 mil são feitas em transportes coletivos, 11.500 mil em carros individuais e 12.500 de forma não motorizada (como de bicicleta e caminhando). (Os valores estão arredondados). Isso significa que os 90% das vias ocupadas por carros estão sendo usados para transportar mais ou menos um terço das pessoas.
Há uma imagem que ajuda a visualizar isso. Talvez você conheça a versão alemã dessa foto abaixo, mas essa projeção foi feita pela prefeitura de São Paulo para ilustrar que necessários 127 carros para transportar 190 passageiros. Esses mesmo 190 passageiros poderiam estar em dois ônibus ou em um bi-articulado, e ocupariam muito menos espaço.
Diante disso, acho que fica claro que o que congestiona as ruas de São Paulo é o excesso de veículos individuais. Mas Serra não estava atacando o transporte público em si. O que ele defende é que as vias da cidade já estão saturadas e mais ônibus só vão piorar o trânsito. Para ele, o investimento em transportes públicos deve ser concentrado em transporte sobre trilhos.
Aí entram mais alguns dados do engenheiro Horácio Figueira: Tomando uma avenida média de São Paulo como exemplo, a av. Brasil, os gastos necessários para criar um corredor de ônibus na faixa da direita giram em torno de R$ 0,5 milhão. Se fosse uma faixa à esquerda, sem interrupção pelo tráfego de carros, o valor subiria para R$ 10 milhões. Agora, se o investimento fosse feito para colocar em prática uma linha de metrô, o montante bateria os R$ 200 milhões. Por dia, essa linha de ônibus transportaria de 3 a 4 milhões, enquanto a linha de metrô daria vazão a 850 mil pessoas. Transporte sobre trilhos é pelo menos 10 vezes mais caro do que uma faixa de ônibus e transporta 4 vezes menos gente. Um bom exemplo é Londres, onde os 1.500 quilômetros de metrô transportam metade dos passageiros de ônibus. (Há uma bela reportagem sobre isso da também colunista do Planeta Sustentável Carolina Derivi.
Veja, não se trata aqui de escolher entre um ou outro, mas de priorizar o que for mais adequado a cada situação.
O urbanista do Gehl Architects, Jeff Risom, defende que, do ponto de vista da mobilidade, a boa cidade é a que possui mais opções. “É a cidade que me oferece uma gama diferente de meios de locomoção para que eu possa escolher o que melhor atende minhas necessidades naquele dia”. O diretor do departamento de mobilidade da prefeitura de Amsterdam, Fokko Kuik, partilha dessa opinião. “Cada meio de transporte atende a uma necessidade específica”, explica. Na capital holandesa, as vias são divididas em 5 tipos diferentes, algumas só para pedestres, algumas para bicicletas e trens, outras para carros e ônibus, etc.
Em Londres, o pesquisador Yves Cabannes, da University College of London, é um defensor de políticas públicas que inibam o uso de carros e incentivem maneiras “mais inteligentes” de se locomover. “Sistemas de carros compartilhados e políticas públicas como proibir estacionamento em locais públicos ou aplicar pedágio urbano em áreas do centro expandido são passos inevitáveis para sanar o congestionamento de cidades como São Paulo”, disse ele.
Serra discorda. Para ele, o prefeito que tentar implantar pedágio urbano em São Paulo vai sofrer um impeachment.
Esse não é um blog partidário. Minha intenção não é influenciar seu voto com base em declarações ditas durante um debate. O foco aqui é debater planejamento urbano, e, principalmente, combater ideias velhas.
Por Renato Lobo